terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

POEMA MAIS OU MENOS DE AMOR


 Eu queria, senhora,
ser o seu armário
e guardar seus tesouros
...
como um corsário.
Que coisa louca:
ser seu guarda-roupa!
Alguma coisa sólida,
circunspecta e pesada
nessa sua vida tão estabanada.
Um amigo de lei
(de que madeira eu não sei).
Um sentinela do seu leito
— com todo o respeito.
Ah, ter gavetinhas
para suas argolinhas.
Ter um vão
para o seu camisolão
e sentir o seu cheiro,
senhora,
o dia inteiro.
Meus nichos
como bichos
engoliriam suas meias-calças,
seus sutiãs sem alças.
E tirariam nacos
dos seus casacos
Ah, ter no colo,
como gatos,
os seus sapatos.
E no meu chão,
como trufas,
suas pantufas...
Suas echarpes, seus jeans,
seus longos e afins.
Seus trastes
e contrastes.
Aquele vestido com asa
e aquele de andar em casa.
Um turbante antigo.
Um pulôver amigo.
Bonecas de pano.
Um brinco cigano.
Um chapéu de aba larga.
Um isqueiro sem carga.
Suéteres de lã
e um estranho astracã.
Ah, vê-la se vendo
no meu espelho, correndo.
Puxando, sem dores,
os meus puxadores.
Mexendo com o meu interior
— à procura de um pregador.
Desarrumando o meu ser
por um prêt-à-porter...
Ser o seu segredo,
senhora,
e o seu medo.
E sufocar,
com agravantes,
todos os seus amantes
LUÍS FERNANDO VERÍSSIMO

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